sexta-feira, 2 de outubro de 2009

A importância da estabilidade política

O resultado das últimas eleições legislativas ganhas pelo Partido Socialista com maioria relativa, aliado ao arrufo político - institucional entre Governo e Presidente da Republica, suscita algumas preocupações – fundamentadas – dos analistas e comentadores sobre a governabilidade futura e a estabilidade política do país. Muitos prognosticam que este Governo não vai completar esta legislatura e, é bem provável que tenham razão. Desde o 25 de Abril apenas um Governo de maioria relativa – o primeiro de António Guterres – conseguiu completar uma legislatura. E, certamente ainda está presente na memória dos Portugueses a negociação com o deputado Daniel Campelo para que um Orçamento de Estado pudesse ser aprovado na Assembleia da Republica.
Defendo que a melhor solução dentro do nosso regime político são as maiorias absolutas, pois, será a forma mais eficaz do Governo pôr em prática o programa eleitoral sufragado pelos Portugueses. Porém, as maiorias absolutas devem ser legitimadas a políticos competentes, humildes, com apego à «causa pública», de não governar para as estatísticas nem pensar na manutenção do poder, agir segundo o postulado do imperativo categórico do filósofo Immanuel Kant. Julgo que não temos no panorama político partidário pessoas com tais virtudes, porque os próprios partidos políticos fecham-se ao exterior, afastando os mais competentes, sonegando as vozes daqueles que pensam por si, que são independentes, com excepção das personalidades que têm peso político, Manuel Alegre é um exemplo paradigmático.
Há quem pergunte se a estabilidade é um fim ou um meio – com a intenção óbvia de concluir que, sendo apenas um meio, pode e deve ser posta em causa sempre que valores «mais altos» se levantem. Esta forma de colocar o problema é falaciosa. A verdade é que, como a História abundantemente mostra, sem estabilidade política não se constrói nada. Assim, apesar de ser um meio, a estabilidade é um requisito indispensável para atingir qualquer objectivo. É a base sobre o qual se edifica o desenvolvimento político e económico. Sem estabilidade política, estamos sempre a voltar ao princípio. Ao ponto de partida.

Vamos supor que o caminho de Lagos até ao Porto é o objectivo do Governo, o seu programa eleitoral. E, para isso, o Governo põe em prática um certo número de medidas políticas para lá chegar. Alcançado o ponto A verifica que o caminho traçado foi errado, as medidas tomadas não foram as melhores para atingir o objectivo pretendido – que é chegar ao Porto. Normalmente o que acontece em Portugal, é fazer tábua rasa do tudo quanto se fez e começar de novo, voltar ao ponto de partida. Mas chegando ao ponto B conclui-se novamente que estas medidas ainda não são suficientes para chegar ao Porto, e com o ponto C passa-se a mesma coisa. Continuamos no ponto de partida, sem que nada se tenha construído, gastou-se tempo, recursos, medidas avulsas, expectativas frustradas e ficou tudo na mesma, nalguns casos poderemos até regredir: ao invés de ficarmos em Lagos ficamos sem rumo e sem norte a ver navios ao largo de Marrocos.
Sem estabilidade política, sem medidas de continuidade, com sucessivas quedas de Governos antes do final dos seus mandatos, o progresso do país gangrena. Repare-se que nos últimos cento e nove anos, em Democracia, apenas três mandatos foram concluídos, isto é, 12 anos de estabilidade em regime democrático – na 1ª república não houve nenhum Governo que levasse um mandato até ao fim, nem sequer a meio.

Ao contrário das políticas de ruptura, as politicas de continuidade não desmancham tudo quanto foi feito, corrige-se. Assim, chegando ao ponto A e tendo noção que esse não é o melhor rumo para chegar ao Porto, fazemos uma correcção na trajectória em direcção ao ponto B. Mesmo assim, se não for suficiente, corrigimos novamente até ao ponto C.
Ao fim de algumas correcções de percurso sem voltar ao ponto de partida, chegámos ao Porto, atingimos o nosso objectivo – quando no exemplo anterior, ao fim do mesmo tempo estávamos muitíssimo longe, ainda estávamos em Lagos. Isto ilustra de forma rudimentar as enormes vantagens das políticas de continuidade sobre as politicas assentes em constantes rupturas – palavra mais usada nos discursos políticos de Francisco Louçã. As rupturas, em política, são por vezes necessárias, mas devem ser entendidas como situações excepcionais. É errado mudar tudo quando muda a maioria no poder: em muitos casos, o que se perde, é muito mais do que se ganha, mesmo admitindo que se ganha alguma coisa, o que frequentemente não acontece. A mudança radical sempre que o Governo muda, significa o continuo regresso ao ponto de partida, o permanente retorno à estaca zero. Ora, a evolução e o progresso só se dão, acrescentado valor ao que existe.
O grande problema nacional é que salta de revolução em revolução sem conseguir encontrar um rumo – e volta sempre ao princípio. O país não aposta no esforço contínuo, na pedra posta em cima de outra pedra, mas na ruptura que deita tudo abaixo. Foi a revolução republicana – que nos propunha uma República redentora. Foi o 28 de Maio – que afirmou o primado da ordem. Foi o 25 de Abril – que apontou como remédio a democracia. Mas os problemas do país parecem ser sempre os mesmos.
O que nos falta, em grande parte, é o sentido da continuidade – que só a estabilidade permite. Em ambiente de instabilidade não se investe, não se criam hábitos de convivência política, o ambiente é de desconfiança. Os investidores não se sentem estimulados a investir por falta de confiança – esta evidência é leccionada em qualquer curso que tenha a disciplina de Introdução à Economia. Os investidores e os empresários são levados a esperar por melhores dias, por novos Governos ou outra estabilidade política. Por outro lado, como se parte do princípio de que o Governo não irá durar um mandato completo, a oposição é estimulada a agitar-se para conseguir derrubá-los antes de tempo – mormente através da influência que o Partido Comunista Português tem nos sindicatos, como se isso não bastasse, temos tido nos últimos nove anos a demagogia tresloucada de Francisco Louçã.
Ou seja: a instabilidade atrai instabilidade. E o mesmo vale para os partidos e os poderes autárquicos: como se calcula que os lideres não conseguirão cumprir os mandatos completos, os opositores internos agitam-se para os derrubar a meio dos mandatos. E assim sucessivamente, entra-se num ciclo vicioso. Não é difícil perceber que a instabilidade política fomenta a todos os níveis a deslealdade, oportunismo, o aventureirismo. E, como não se sabe qual irá ser o dia de amanhã, aquilo com que se poderá contar, cai-se no imediatismo, no tacticismo puro e desleal. Tudo se esgota no momento, não se pensa a prazo, não se planeia o futuro – porque o futuro não existe, não está no horizonte dos políticos.
Os Governos são tentados a pôr em prática medidas de curtíssimo prazo, porque nunca sabem se chegarão ao fim do período para o qual foram eleitos. No melhor dos casos projectam a sua acção para vencer as próximas eleições. Isso impede as políticas de longo alcance assentes numa visão ulterior, de grande escala, não comprometida nem dependente da circunstância.
Como escrevia um autor americano «os ciclos eleitorais tornam as opções estratégicas míopes»

4 comentários:

  1. Gomes os teus textos cheiram a laranjas.

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  2. A Manuela Ferreira Leite disse o mesmo em menos palavras: "não é bom haver seis meses sem democracia para pôr tudo na ordem".

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  3. Maravilha o seu cantinho.
    Clicando daqui, clicando dali, cheguei até você.
    Gostei do seu espaço.
    Certamente voltarei mais vezes.
    Convido a conhecer FOI DESSE JEITO QUE EU OUVI DIZER... em http://www.silnunesprof.blogspot.com
    Saudações Florestais !

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  4. "Não é difícil perceber que a instabilidade política fomenta a todos os níveis a deslealdade, oportunismo, o aventureirismo."

    Meu caro, diria que não é difícil constatar que a estabilidade política das maiorias absolutas tem trazido arrogância, autoritarismo e clientelismo.

    Não é que tenha fé nesta maioria relativa, o que estou mesmo farto é desta conversa que os do centro são gémeos siameses e Deus nos acuda se ganham os das pontas.

    A verdade é que continuamos a ser conservadores, avessos a mudanças...

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