segunda-feira, 20 de outubro de 2008

Mundial 2018 na Península Ibérica!

Veio a público, a possibilidade de Portugal e Espanha realizarem o mundial de futebol de 2018 em pareceria, portanto, um mundial Ibérico. Esta ideia, ou intento, tem colhido simpatias de um lado, nomeadamente do Dr. Gilberto Madail, presidente da Federação Portuguesa de Futebol e, antipatia por outro, tendo como porta-voz o Presidente da República – Prof. Cavaco Silva. O primeiro assevera que Portugal tem as infra-estruturas do Euro 2004 e, era uma boa oportunidade de recuperar facilmente grande parte desse investimento, para além disso, o mundial representaria uma enorme fonte de receita para a Península Ibérica, e lembra que o último Campeonato do Mundo – Alemanha 2006 – gerou um Cash Flow no valor de 10 mil milhões de Euros. Em relação ao segundo – Cavaco Silva –, enfatiza que há outras prioridades, e que apesar de o país estar mais desenvolvido, o mundial não traria nenhuma solução para os problemas estruturais, mas antes, agudizava-os. Pois, na minha opinião, ambos estão errados.

Há dois posicionamentos totalmente distintos: quem defendeu a realização do evento, afirma que foi o melhor Europeu de sempre e, é verdade que foi acolhido pela UEFA e pela crítica em geral como o melhor Europeu, para além disso, modernizou as infra-estruturas desportivas com a construção de novos estádios de futebol, e prestigiou Portugal além fronteiras; quem foi contra, assegura que a organização do Euro 2004 foi um esbanjamento de euros, nada trouxe de bom para Portugal e, o avultado investimento poderia ter sido aplicado noutras áreas como: saúde, educação, justiça, acção social, combate ao desemprego, etc. Nisto reside o Busílis da questão; as grandes deliberações em Portugal são binárias (sim ou não; bom ou mau; verdadeiro ou falso), temos o exemplo recente da dificuldade que houve na decisão do local para a construção do novo Aeroporto Internacional de Lisboa, e do TGV que continua em estudo.

A questão que eu coloco é a seguinte: o que motivou a organização do Euro 2004, e quais as suas consequências?

Por analogia aos melhores campeonatos da Europa, Portugal não é competitivo mas, também não é desinteressante em relação aos mais pobres; somos por isso, muito melhores que os piores, e piores que os melhores. Ora, foi para impelir o nosso futebol à vanguarda dos mais competitivos e atractivos da Europa, que motivou a organização do Euro 2004. Esta alegação foi sustentada pelos principais agentes desportivos como imprescindível para assinalar um ponto de viragem no futebol português. Segundo os eloquentes, os estádios estavam velhos e obsoletos; eram grandes e a sua manutenção tinha custos elevados; eram desprovidos de boas condições de segurança e, por isso, afastava o público dos espectáculos; não davam resposta ao futebol moderno, ao futebol – indústria. Em resumo, o futebol português definhava porque, os estádios não tinham conforto, segurança, funcionalidade, eram grandes e, representavam elevados custos de manutenção, era premente modernizar as infra-estruturas.

Apesar da veracidade destes argumentos, a verdade é que não passou dum pérfido ardil económico que beneficiou poucos em prejuízo de muitos. O bolo financeiro para o Euro 2004 suscitou a ganância sôfrega dos dirigentes mais poderosos, dos mentores mais influentes. A UEFA, exigia apenas seis estádios - novos ou remodelados – mas, Portugal construiu dez!
Obviamente, que o número excessivo de estádios e a falta de frugalidade dos investimentos deram razão aos mais cépticos, apesar do sucesso do evento. Por isso, a posição do Presidente da República em relação ao Mundial 2018 é perfeitamente compreensível, mas não deve ser implacável. Ora, na organização do Euro 2004 fomos eficazes mas não fomos eficientes. Eficazes, porque os resultados da organização corresponderam aos objectivos propostos perante o Comité da UEFA, embora, considere que a concepção estratégica do projecto não tenha sido a mais adequada à realidade do país. Não fomos eficientes porque a proporção da relação entre a qualidade e a quantidade investida, não correspondeu à qualidade e quantidade dos resultados obtidos, isto é, com um investimento muito inferior, teríamos obtido os mesmíssimos resultados.

Passados quatro anos qual o estado do futebol português?

Principiemos pelos estádios: Faro / Loulé, está fechado, não há nenhum clube a usufruir deste recinto, o Farense dissolveu a equipa profissional de futebol e, ficámos com um estádio novo no Algarve para receber raramente um jogo da selecção nacional, um desperdício; Luz e Alvalade, são bons recintos mas o endividamento destes clubes estrangulou significativamente os seus orçamentos, apresentam equipas medíocres com um futebol pouco atractivo e, os estádios apesar de serem muito mais pequenos raramente enchem; Leiria, uma monstruosidade, para além do clube ter praticamente assegurado a descida de divisão, tem uma média de 700 espectadores – incompreensível a sua construção; Coimbra, está no centro do país, mas o clube não ficou melhor, luta avidamente para não descer de divisão; Aveiro, igual a Coimbra mas, já milita na segunda divisão; Bessa, mais olhos que barriga, tanto quis ser grande que o clube ainda arrisca a dissolvência com um passivo perto de 80 milhões de euros, o clube estava bem melhor antes do novo estádio; Dragão, a grande excepção do futebol português, é um clube moderno na dianteira dos melhores da Europa; Braga e Guimarães também foram bons investimentos, têm equipas competitivas a nível interno e têm grande apoio das massas associativas. Bastavam os estádios dos clubes: Benfica, Sporting, Porto, Braga, Guimarães e Coimbra, os outros quatro foram investimentos mal executados.

Portanto, apesar de haver dez novos estádios, o futebol português não progrediu nem melhorou, bem pelo contrário, nalguns casos aviltou. Mas, há outros interesses que impedem a evolução do futebol português. Por exemplo: os jogos do Benfica, Porto e Sporting são sempre transmitidos pela televisão, seja em canal aberto ou na SporTv e, são realizados sempre à noite. Ora, sendo o futebol um desporto de Inverno, e sendo os jogos pouco apelativos em termos de competitividade e qualidade, as pessoas preferem assistir comodamente nas suas casas, ao invés de se deslocarem ao estádio, estes novos hábitos contribuem decisivamente para o afastamento do público. Ao contrário de Inglaterra, os jogos mesmo em horários diferentes realizam-se de tarde, e os estádios estão sempre cheios.

Para o mundial de 2018 não se pede que Portugal construa mais estádios, seria uma palermice, até porque, pela diferença dos países caberia sempre à Espanha a maior fatia de responsabilidade na organização do evento. Seria uma boa oportunidade para Portugal promover o turismo, pois os investimentos já foram feitos. É nesta posição que discordo do Presidente da Republica mas, compreendo-o, pois, Cavaco Silva sabe perfeitamente que a promiscuidade do dirigismo desportivo e a política é colossal.

Quid enim salvis infamia nummis? [Juvenal] – Que importa a vergonha, se o dinheiro está seguro?

Lisboa, 26 de Fevereiro de 2008

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